Para
76% dos brasileiros, as escolas devem continuar fechadas nos próximos dois
meses por causa da pandemia do novo coronavírus, segundo pesquisa Datafolha. Em
todas as faixas etárias e de renda e em todas as regiões do país, a maioria da
população defende que as aulas presenciais ainda não sejam retomadas.
A
margem de erro é de dois pontos percentuais, para mais ou para menos. O
Datafolha ouviu 2.016 pessoas de todo o país na terça (23) e na quarta (24) por
telefone, modelo que evita o contato pessoal entre pesquisadores e
entrevistados e exige questionários mais rápidos.
O
resultado da pesquisa mostra que, apesar de a maioria da população (52%)
concordar com a reabertura do comércio em estados e municípios neste momento da
pandemia, uma proporção bem menor (21%) defende a reabertura das escolas.
Para
especialistas em educação e infectologistas, o pouco apoio para a retomada das
aulas presenciais pode ser pelo temor de que os alunos não sigam as regras de
distanciamento, devido à infraestrutura das escolas ou por causa dos
deslocamentos necessários para chegar às escolas.
Nenhum
estado decidiu retomar as aulas presenciais, mas alguns governadores, como os
de Goiás e do Distrito Federal, estudam reabrir parcialmente as unidades em
agosto. Em São Paulo, a previsão é de retomada em setembro.
Não
há diferença significativa entre as faixas de renda familiar. Entre as pessoas
que têm renda familiar de até 2 salários mínimos, 77% defendem a continuidade
do fechamento das escolas. Entre os que ganham mais de 10 salários mínimos, são
73%.
O
tipo de município também não altera a percepção. Entre os que moram em cidades
de regiões metropolitanas, apenas 21% acham que as aulas deveriam ser
retomadas. Nos municípios do interior,, são 22%.
A
principal diferença de opinião ocorre, no entanto, na segmentação de avaliação
ao presidente. Apenas 9% dos que avaliam o governo de Jair Bolsonaro (sem
partido) como ruim ou péssimo disseram que as escolas devem reabrir. O número
sobe para 38% entre os que consideram o governo ótimo ou bom.
Também
há diferença maior de opinião entre os sexos. Enquanto, 81% das mulheres
defendem a continuidade do fechamento, 71% dos homens responderam da mesma
forma.
Entre
os diferentes tipos de ocupação profissional também não há grande divergência
de opinião, com exceção do grupo dos empresários, em que 31% defende a
reabertura das escolas.
Outro
grupo com maior proporção de pessoas que defendem a reabertura das escolas é
dos que dizem estar vivendo normalmente durante a pandemia: 36% acham que as
aulas presenciais devem voltar. Entre os que dizem só sair de casa quando é
inevitável ou estarem totalmente isolados, a taxa é de 19% e 18%,
respectivamente.
“A
população está muito consciente dos riscos que está correndo com a pandemia e,
ainda que crianças e adolescentes não estejam no grupo de risco, tem receio de
colocá-los em uma situação de exposição. As pessoas também devem pensar que
retirar os alunos de casa significa expor muita gente ao vírus”, avalia o
infectologista Jean Gorinchteyn, do Instituto de Infectologia Emílio Ribas.
Ele
destaca que a reabertura das escolas envolve a circulação de muitas pessoas. O
Brasil tem, apenas na educação básica, 48 milhões de estudantes e 2,5 milhões
de professores, o que representa 24% da população.
“Temos
que avaliar ainda que muitas crianças não vão sozinhas à escola, então a ida
delas para as aulas envolve a circulação de muita gente nos ônibus, metrô, nas
ruas. Sem falar na quantidade de pessoas que vão atuar na limpeza, alimentação
e organização dos colégios”, diz.
Para
o infectologista Celso Granato, professor da Unifesp e diretor clínico do grupo
Fleury, a retomada das aulas presenciais vai exigir um protocolo sanitário
rigoroso e um grande trabalho de orientação para professores e alunos.
“Crianças e adolescentes não têm tantas complicações com o vírus, mas, para evitar
que contaminem seus familiares e professores, é importante que haja esse
cuidado, já que a escola é um ambiente onde vão ficar por muitas horas.”
Maria
Helena Guimarães de Castro, membro do Conselho Nacional de Educação, diz que a
infraestrutura e as condições das escolas públicas não ajudam a transmitir
segurança às famílias. “Enquanto em países como a Alemanha vemos a testagem de
crianças na porta dos colégios, aqui nos questionamos se haverá água e sabão
para os alunos lavarem as mãos”.
O
governo Bolsonaro não criou nenhuma linha específica de financiamento para
educação em meio à pandemia, apesar dos pedidos de estados e municípios por
recursos emergenciais que ajudem a preparar as escolas para a volta às aulas.
Até o momento, o MEC (Ministério da Educação) só manteve os repasses já
previstos para apoio pedagógico e merenda.
Além
do receio de contágio das crianças, Maria Helena destaca também que as famílias
temem o impacto emocional das restrições impostas pelo coronavírus no ambiente
escolar. “Os alunos vão voltar para um ambiente completamente estranho. Eles
estavam acostumados a se abraçar, dividir materiais, ter liberdade para
brincar. Tudo vai ser muito mais restritivo e é preciso pensar no impacto
social e emocional dessa nova situação.”
Professor
adjunto da Universidade Columbia e ex-secretário de educação de São Paulo,
Alexandre Schneider diz que o plano de volta às aulas deve ter também como
estratégia formas de dar segurança às famílias e aos alunos para a volta ao
ambiente escolar. “Vai ser preciso uma reconexão com a escola, para alunos e
professores, que podem ter perdido pessoas queridas, ter vivido em ambientes
violentos nesse período ou em condições econômicas precárias.”
A
funcionária administrativa Soraia Mota, 38, conta que não se sente segura em
levar a filha Manuela, de 5 anos, de volta à escola Mary Ward, na zona leste de
São Paulo. O maior receio é que a menina não entenda a necessidade de manter
distanciamento dos colegas.
“Eu
acho que ela não vai conseguir ver os colegas e não abraçar, não encostar. Ela
está acostumada a esse contato com eles e, mesmo que eu oriente, acho que ela
vai esquecer. Também não sei se seria muito saudável deixá-la em um ambiente
tão restritivo. Pelo menos em casa ela tem liberdade”, disse.
Fonte: FOLHA
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