Por Gregório Grisa1
@grisagregorio
Os
setores que creem que vamos recuperar as aulas depois e se agarram ao princípio
da igualdade de acesso para defender que nada seja ofertado e registrado agora
estão cometendo uma injustiça com os mais pobres
O
necessário distanciamento social, em função da pandemia de coronavírus, fez com
que se cancelassem as atividades escolares presenciais em praticamente todo o
mundo. Nas salas de aula, o contato de estudantes e docentes é próximo, por
isso a escola deve ser das últimas instituições a voltar a funcionar e das
primeiras a suspender atividades no caso de nova onda da doença. A depender da
duração do fechamento, a angústia de pais, estudantes e professores sobre a
concretização do ano letivo aumenta no Brasil.
A
educação vive um momento de incertezas e muito tem se debatido sobre o que
fazer neste momento de emergência. Praticamente todos os estados, por meio dos
Conselhos Estaduais de Educação, normatizaram a possibilidade de considerar
atividades remotas no cumprimento do calendário escolar, mediante
condicionantes como comprovação da realização das atividades, formulação,
divulgação e acompanhamento de planejamento específico e registros da
participação dos estudantes por meio de relatórios.
O
ideal seria repor todas as atividades de maneira presencial, mas o tempo será
inimigo. Concentrar tudo para depois pode significar sobrecarga de trabalho
pedagógico para docentes e estudantes. Diante da possibilidade de considerar as
atividades remotas, é importante elencarmos princípios e critérios para
fazê-lo. Os princípios que entendo fundamentais são: 1) flexibilidade, 2)
garantia do direito à educação, 3) foco em habilidades mais do que em conteúdos
e 4) bom senso no que tange ao volume de atividades propostas. Ao detalhar os
princípios na sequência, trato dos critérios.
1)
Flexibilidade para redes, escolas e docentes avaliarem com autonomia o real
alcance das medidas propostas em relação aos alunos. Isso deve ser orientador
para o registro formal.
2)
Garantia do direito à educação será avaliada pelo atingimento dos objetivos do
planejamento, resguardada a possibilidade de realização das atividades no
retorno para alunos que não conseguiram fazê-las. A demanda por reforço
pedagógico será significativa, a avaliação diagnóstica será fundamental para
ofertá-lo.
3)
Focar em habilidades, ou seja, optar por atividades concernentes à experiência
remota, que explorem criatividade e protagonismo discente, que tenham registro
e feitura mais simples. Esse critério será fundamental para pensar a avaliação
do processo.
4)
O bom senso para que não confundamos as atividades remotas com as presenciais
em termos de volume, densidade e complexidade. Distanciamento social é tempo
atípico, crianças e jovens contam com contextos de apoio familiar distintos, as
atividades escolares não podem representar estresse adicional.
Feitos
esses apontamentos, gostaria de questionar a resistência de setores mais à
esquerda do espectro político em relação a realização e registro de atividades
remotas no período de afastamento social. Em nome da defesa dos que “não têm
acesso”, adotam uma postura reativa que, a meu ver, é de quem não compreendeu a
natureza do que estamos vivendo. O Estado, por meio das instituições, tem de
tentar acessar os que não têm acesso, mesmo sabendo que não irá conseguir
plenamente.
Os
efeitos da crise da pandemia já existem e irão aumentar. Nosso desafio é
minimizá-los o máximo possível. As desigualdades sociais e educacionais já
existiam antes da pandemia e não iremos solucioná-las agora e nem no retorno às
aulas. Nesse sentido, devemos ser propositivos e ofertar atividades nos mais
diversos meios possíveis, respeitadas as especificidades das etapas e
modalidades de ensino.
Os
setores que creem que vamos recuperar as aulas depois (ou no ano que vem) e se
agarram ao princípio (fundamental, mas ora abstrato) da igualdade de acesso
para defender que nada seja ofertado e registrado agora estão cometendo uma
injustiça com os mais pobres. Há pesquisas que demonstram que um período longo
de inatividade escolar produz atrasos na aprendizagem, em especial para os mais
vulneráveis.
1 Professor do IFRO Rio Grande do Sul.
Doutor em Educação e PHD
em Sociologia pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul.
Contato: grisagregorio93@gmail.com
Fonte: NEXO JORNAL
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